segunda-feira, fevereiro 03, 2020

Desafio dos Pobres III

As paróquias de Camarate e Apelação, no concelho de Loures, estão ao cuidado dos Missionários Combonianos que têm aí uma comunidade de quatro missionários. Dois de nós, eu e o Ir. José Manuel, estamos agora a dar início a um projeto da iniciativa dos nossos superiores provinciais da Europa. O projeto é na área da pastoral social, trabalho com migrantes, comunidades ciganas, justiça e paz.
Ultimamente temos falado muito de periferias e corremos o risco de esvaziar de sentido esta expressão! O objetivo é trazer as periferias para o centro; não para o centro do sistema opressor e egoísta que mata e mantém pessoas numa situação contínua de empobrecimento. Mas é trazer os pobres para o centro das nossas atenções, das atenções das igreja e das autoridades, que têm a responsabilidade de cuidar deles e de lhes proporcionar uma vida digna.
A igreja portuguesa, da qual eu faço parte, deve ter a coragem e a ousadia de levar à prática esta etapa nova da evangelização tão desejada pelo Papa Francisco, e reinventar a linguagem do evangelho de Jesus, isto é, fazer com que o evangelho continue a ser Boa Notícia. O grande desafio que eu sinto como missionário, é o de perceber que Camarate e Apelação são o lugar da missão que o Senhor quer para mim, neste momento da minha vida.
Levar Deus às periferias é a metodologia de Jesus. Ela deve ser também a minha. Como sacerdote missionário sou chamado a ser sinal da presença de Deus, lá onde os pobres vivem e onde Deus parece muitas vezes estar ausente.
Gostaria que o meu ministério sacerdotal fosse o contributo, embora pobre e talvez insignificante, para levar Jesus Cristo às periferias, sejam elas geográficas ou existenciais. Para isso, devo estar presente na vida dos pobres e os pobres devem tornar-se cada vez mais o centro do meu ministério que deve ser sempre um ministério de presença e inserção.

Jesus não chamou ninguém para ser sacerdote, mas sim discípulo. Talvez alguns de nós fiquemos escandalizados com estas palavras. Ele não foi condenado por ter proposto uma liturgia diferente, mas porque tomou partido pelos pobres e convidou um grupo de amigos para o seguirem, e com isso desafiou e provocou os poderosos do seu tempo, incluindo os sacerdotes de Jerusalém. Aliás, Jesus teve alguns problemas com os sacerdotes de Jerusalém, alguns dos quais contribuíram para a sua condenação à cruz. Há uma crítica severa que Jesus faz aos sacerdotes na parábola do bom Samaritano: a liturgia (dever sacerdotal) deve ser subordinada ao serviço ao outro, isto é, fazer-se próximo é mais importante do que a liturgia. E eu devo estar sempre muito atento para não ser objeto da mesma crítica. A liturgia, por mais importante que seja, ou me leva a ser “próximo”, ou então é desprovida de significado.
A questão que eu me coloco muitas vezes é esta: como é que eu estabeleço o equilíbrio entre aquilo que é a pastoral tradicional ou de manutenção, também ela necessária, e os grandes desafios que me são diariamente colocados pelos enormes problemas sociais que afetam a nossa gente e que a fazem sentir-se abandonada por por todos, incluindo Deus?
Partilho convosco estas histórias banais da minha vida e do meu ministério porque elas marcaram profundamente a minha vida de sacerdote missionário. Tive a graça de ter podido partilhar da vida de tanta gente maravilhosa que, através da partilha das suas vidas comigo me ensinaram a ser sacerdote missionário e a descobrir Deus nos acontecimentos simples da vida daqueles que o Senhor foi colocando no meu caminho.

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