segunda-feira, maio 18, 2009

Deus está onde o pobre vive

A aldeia de Nabaguu, na missão de Nzara no Sul do Sudão, fica a 50 quilómetros da missão, no coração da floresta. A viagem até lá é longa e cansativa. Depois de alguns quilómetros no caminho principal, iniciámos a nossa entrada na floresta por um carreiro estreito e que parecia não ter fim. O calor era muito intenso e a humidade via-se no ar. Depois de várias horas a pedalar por entre árvores enormes e de folhagem exuberante e verde, chegámos.
À nossa chegada encontrámos uma pequena comunidade de cristãos que nos acolheram com uma alegria e entusiasmo que me emocionaram. Sentia-me exausto da longa viagem. Mas a alegria destes cristãos, que já não viam o padre havia três anos, fez-me superar a fadiga e imediatamente os segui até ao lugar que tinham nos preparado para descansar. A alegria que aqueles cristãos simples e pobres expressavam por terem a oportunidade de celebrar a Eucaristia (a primeira vez em três anos!) era, para mim, estímulo e fonte de inspiração.
Apesar de viverem tão longe da missão, e de terem a visita to missionário tão raramente, estes cristãos continuavam a reunir-se todos os domingos para rezar e partilhar a Palavra de Deus, ajudados pelo seu catequista, Lino Mingerevuru; sinal de que o Espírito do Senhor estava aí onde eles vivem e partilham a sua fé. Aparentemente, estes cristãos vivem “perdidos” na floresta, longe de tudo e de todos; mas no meio deles encontrei sinais maravilhosos da presença do Espírito do Senhor que, ontem como hoje, continua a revelar-se nos simples e nos humildes desta terra. Com Jesus, regozijei-me no Espírito e vi com os meus próprios olhos sinais (muitos sinais!), de como Deus se revela nos pobres.
Enquanto preparávamos o programa para o dia seguinte, apresentaram-me Geanmarie Kerekpiogbe (o significado do sobrenome é: “muito-má-morte”) que pedia para ser baptizado. Carregava sempre tudo o que possuía: uma pequena panela, um cobertor e a bengala que o ajudava a caminhar na sua velhice. “Não posso deixar as minhas coisas em casa” disse com resignação. “É que na volta posso não encontrar nada!”, acrescentou.
O encontro com este ancião abriu-me os olhos para a realidade dos pobres e humildes na sua relação com Deus. Enquanto a minha preocupação era se ele sabia o catecismo, ou se sabia rezar, ele surpreendeu-me com estas palavras, que só podem brotar do coração de alguém a quem o Senhor se revela pessoalmente: “Barani, rogo gi sende re mi adu ni boro rungo; mi naida ka zio batisimo ka bata be rungo ariyo.” (Padre, fui um pobre nesta terra; quero ser baptizado para me salvar da pobreza no Céu).
Fiquei sem palavras. A fé deste ancião ajudou-me a perceber que Deus não se preocupa se sabemos ou não as leis, ou se sabemos ou não dizer umas orações. Ajudou-me também a encontrar Deus no encontro com o pobre; aí, onde o pobre vive, Deus vive também. O encontro com o velho Geanmarie, como tantos outros encontros que vou tendo todos os dias, ajudou-me a perceber que Deus se revela nos pobres e humildes, que por sua vez nos revelam ‘coisas’ que ‘os sábios e os inteligentes’ tem dificuldade em entender.

3 comentários:

Sandra disse...

Parabéns Pe. Horácio pelo seu blog!! :)
É muito bom para quem está tão longe poder ler e viver um pouco da missão.
Obrigada, por nos dar esta oportunidade de podermos estar mais perto do povo Africano!

Sandra

Anónimo disse...

Amigo e conterrâneo Horácio Rossas
Fico imensamente feliz por esta tua iniciativa. É, sem dúvida, uma belíssima forma de estares mais perto de todos aqueles que te estimam e, sobretudo, um extraordinário meio de partilhares a beleza da missão que te foi confiada…
Parabéns e profícuo anúncio da Boa Nova…
Um abraço em total comunhão…
Pe. Paulo Alves
www.seminarioderesende.com

Margarida Cruz e Silva disse...

Zikomo também para ti e para Deus que nos proporciona a sorte de te ter como amigo.

Um abraço.

Magui

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